Área educativa - Observação de Supercélulas em Portugal continental
Alguns critérios a que os meteorologistas recorrem para identificar SC
Há diversos critérios para a identificação de SC, nem sempre inequívocos quando utilizados separadamente:
i) critério puramente baseado em padrões do campo da reflectividade radar – em geral pela presença de ecos em forma de gancho ou estrutura em forma de rim – normalmente observados a baixa altitude. Este tipo de assinaturas não é muito típica de SC observadas sobre o território do continente. No entanto são, por vezes, identificáveis, como foi o caso da situação de Alcanena (distrito de Santarém), em 9 de Abril de 2008. Neste caso, foi visível uma SC, assinalada na figura abaixo, com um padrão de reflectividade em forma de rim, sugestivo da presença de updraft e de mesociclone.
PPI de reflectividade (dBZ) evidenciando uma assinatura em forma de rim, a cerca de 500m de altitude, correspondente à SC assinalada. A forma de rim resulta do efeito combinado da presença de rotação mesociclónica (representada por círculo) e de uma zona com pouca reflectividade associada à updraft (representada por seta), 9/Abr/08, 7:56 UTC.
ii) critério baseado no campo da velocidade – persistência da característica assinatura de mesociclone, sendo visível um aglomerado de pixéis com valores de velocidade negativa (componentes de aproximação ao radar) adjacente a um aglomerado de pixéis com valores de velocidade positiva (componentes de afastamento do radar), conhecida como assinatura dipolar. Os valores extremos de velocidade associados a cada um destes aglomerados nem sempre são simétricos, como resultado do movimento relativo da SC em relação ao radar. Este é um critério que permite identificar inequivocamente uma SC, em especial se for possível remover, automaticamente, as componentes do movimento da célula convectiva em relação ao radar. Relativamente ao exemplo referido no critério anterior, foi possível identificar uma circulação mesociclónica, com assinatura dipolar (ver figura abaixo). Para o efeito, foi utilizado um PPI de velocidade Doppler. Esta SC produziu um tornado que causou bastantes danos e gerou um rasto de destruição numa extensão aproximada de 20km.
PPI de velocidade Doppler (m/s) em que é claramente visível a presença de uma assinatura do tipo dipolo, a cerca de 1600m de altitude, correspondente à circulação mesociclónica. As duas setas indicam o sentido da circulação em cada um dos bordos do mesociclone. Neste caso, a intensidade do vento naquela circulação foi de cerca de 20m/s (esta intensidade é, obviamente, muito menor do que a associada ao próprio tornado), 9/Abr/08, 7:57 UTC.
iii) critério baseado na advecção (trajectória). Frequentemente as SC deslocam-se para a direita ou esquerda do escoamento médio, sendo este escoamento médio aquele que dirige o movimento habitual das estruturas não supercelulares. Por exemplo, a sul da cidade de Lisboa, em 2 de Outubro de 2007 foi identificada uma estrutura, assinalada na figura seguinte, caracterizada por se deslocar para Este, num período em que foi visível que as restantes células no mesmo ambiente sinóptico se deslocavam para N/NW – de acordo com o escoamento médio -, na circulação de uma depressão que afectava o território. A observação Doppler mostrou a existência de uma circulação mesociclónica (embora fraca) associada a esta estrutura.
MAX de reflectividade (dBZ) em que é claramente visível a presença de uma célula convectiva, na margem sul do Tejo, nas proximidades de Lisboa, que tem uma trajectória distinta da das restantes células presentes, 2/Out/10, 12:10-14:30 UTC, imagens de 10 em 10 minutos.
Finalmente, há que salientar que as SC têm, em geral, ciclos de vida bastante mais longos do que o das restantes células no mesmo ambiente. Não sendo um critério para as identificar em tempo real, constitui uma característica notável, que a imagem seguinte permite apreciar. Trata-se de um exemplo de SC observada no dia 21/Out/09, em progressão desde o Atlântico, a Oeste/Noroeste de Peniche (10:50 UTC) até próximo da cidade de Portalegre (15:20 UTC). Esta duração, de 4h30, é muito superior à correspondente às restantes células observadas. Diga-se que, em algumas situações, pode suceder não estar sempre a observar-se, exactamente, a mesma estrutura ao longo de toda a trajectória, mas antes outra célula convectiva originada a partir de uma anterior que, entretanto, se extinguiu. Em todo o caso, o potencial para a produção de tempo severo mantém-se durante bastante mais tempo do que o que é habitual noutras células sem características supercelulares.
MAX de reflectividade (dBZ) em que é visível a progressão de uma SC desde o Atlântico até junto à fronteira espanhola. A grande longevidade desta estrutura (assinalada com círculos em algumas imagens, para referência) é uma das características das SC, 21/Out/09, 10:50-15:50 UTC, imagens de 20 em 20 minutos.